Escreve-se, repete-se, cria-se, cita-se. Nas palavras de Nietzsche, funciona mais ou menos assim: “A vantagem de ter péssima memória é divertir-se muitas vezes com as mesmas coisas boas como se fosse a primeira vez”. Dessa forma é o Poucas e Tantas, um pouco de tudo, muitas coisas repetidas, outras inéditas (ou não tão inéditas), algumas curiosidades...

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Monólogo de Segismundo – por Dan Stulbach – Filme “Tempos de Paz”


Ai de mim! Ai pobre de mim!
Que pergunto a Deus para entender.
Que crime cometi contra Vós?
Pois se nasci, entendo já o crime que cometi.
Aí está motivo suficiente para Vossa justiça, Vosso rigor.
Pois o crime maior do homem é ter nascido!
Para maiores cuidados, só queria saber que crimes cometi contra Vós, além do crime de nascer.
Não nasceram outros também?
Pois se outros nasceram, que privilégios tiveram que eu jamais gozei?
Nasce uma ave, e é embelezada por seus ricos enfeites.
Não passa de flor de plumas, ramalhete alado, quando veloz cortando os salões aéreos recusa piedade ao ninho que abandona em paz.
E eu, tendo mais instinto, tenho menos liberdade?
Nasce uma fera, com uma pele respingada de belas manchas, que lembram estrelas. Logo, atrevida, feroz, a necessidade humana lhe ensina a crueldade!
Monstro de seu labirinto!
E eu, tendo mais alma, tenho menos liberdade?
Nasce um peixe, aborto de ovas e lodo, enfeita um barco de escamas sobre as ondas.
Ele gira, gira, por toda a parte, exibindo a imensa liberdade que lhe dá um coração frio!
E eu, tendo mais escolha, tenho menos liberdade?
Nasce um riacho, serpente prateada, que dentre flores surge de repente, de repente. Entre flores ele se esconde, e como músico celebra a piedade das flores que lhe dão um campo aberto á sua fuga!
E eu, tendo mais vida, tenho menos liberdade?
Assim, assim, chegando a esta paixão um vulcão, qual Etna, quisera arrancar do peito pedaços do coração!
Que lei, justiça ou razão pode recusar aos homens privilégios tão suaves e sensação tão única!
Que Deus deu a um cristão, a um peixe, a uma fera, a uma ave?

(La vida es sueño, ato I, cena I – Pedro Calderón de la Barca – 1600-1681)

16 comentários:

  1. A atuação de Dan Stulbach é incrível e o filme é um show de interpretação.

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  2. Tony Ramos, como já sabemos, é a personificação do talento. Dan Stulbach segue o mesmo caminho. O filme é primoroso.

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  3. Simplesmente magníficos o texto e as atuações de Dan e Tony.

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  4. Lagrimas... apenas lagrimas....

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  5. Estupendo. Sensacional.. piesua e atuação

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  6. Que Deus deu a um "cristão", a um peixe, a uma fera, a uma ave?
    ..peque erro: Que Deus deus deu a um cristal (em referência à água...

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  7. ... rsrsrsrsrs...!!!... Cristão...!!!... e aí não vai fazer o acerto, inclusive na pontuação...!!?!

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  8. Um show de interpretação! Um primor de texto

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  9. Fabulosissimo, um dos melhores filmes que já vi, e uma das melhores atuações tbm!!!

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  10. Maravilhoso!! Primorosas atuações. Inesquecível

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  11. Filme imperdível !
    Quem precisa de Oscar para ser um espetáculo ?

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No momento, sou uma citação do Mario Quintana: "A gente sempre deve sair à rua como quem foge de casa, como se estivessem abertos diante de nós todos os caminhos do mundo. Não importa que os compromissos, as obrigações, estejam ali... Chegamos de muito longe, de alma aberta e o coração cantando!"

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